Novos termos de privacidade geram polêmica para WhatsApp; Facebook tenta se explicar, mas abre caminho para Telegram e Signal
O que parecia ser uma mudança rotineira nos termos de privacidade acabou virando uma dor de cabeça para o WhatsApp. Muitos veículos da imprensa entenderam que o app passaria a obrigar o compartilhamento de dados com o Facebook, algo que na verdade ocorre desde 2016. A empresa demorou demais para “evitar a disseminação de notícias incorretas e rumores”, minando a confiança no mensageiro e abrindo caminho para Signal e Telegram.
WhatsApp exige troca de dados com Facebook desde 2016
Basicamente, o que causou toda a comoção não foi algo que a atual política de privacidade adicionou. Na verdade, foi algo que o WhatsApptirou: não há mais um trecho que mencionava a possibilidade de não compartilhar dados com o Facebook. De fato, essa opção existiu… até 24 de setembro de 2016; para a grande maioria dos usuários, que não desligaram essa integração dentro do prazo, a troca de informações já era obrigatória.
Este é o trecho relevante:
Se você já usa o WhatsApp poderá escolher não compartilhar os dados da sua conta do WhatsApp com o Facebook para melhorar suas experiências com anúncios e produtos no Facebook. Os usuários atuais que aceitarem os nossos Termos e Política de Privacidade atualizados terão 30 dias adicionais para definirem sua escolha em Configurações/Ajustes > Conta.
Esse prazo de 30 dias acabou em 2016, quando o WhatsApp tinha 1 bilhão de usuários; agora são mais de 2 bilhões. E já na época, os termos deixavam explícita essa integração: “passamos a fazer parte da família de empresas do Facebook em 2014; como parte desta família, o WhatsApp recebe e compartilha dados com os demais membros”.
Entre os exemplos, a empresa dizia: “o Facebook e outras empresas do mesmo grupo podem usar dados do WhatsApp para fazer sugestões (por exemplo, de amigos, de contatos ou de conteúdo interessante) e mostrar ofertas e anúncios relevantes”. Nada disso mudou nos últimos cinco anos.
O WhatsApp compartilha com o Facebook dados como seu número de telefone (não a agenda de contatos), informações do celular (como o sistema operacional) e seu endereço IP. A empresa continua dizendo que “suas mensagens são criptografadas para que nós ou terceiros não possamos lê-las”; a criptografia de ponta a ponta, que usa o protocolo Signal, não mudou. No entanto, muitos usuários ficaram com a impressão de que o mensageiro iria revelar suas conversas particulares.
Para mim, a reação negativa ao WhatsApp surgiu de uma combinação de fatores:
inúmeras notícias trouxeram o título enganoso de que o WhatsApp iria suspender usuários que não aceitassem a troca de dados com o Facebook, algo que já era obrigatório desde 2016 – isso foi repetido tantas vezes que acabou sendo aceito como verdade;
o WhatsApp foi associado à imagem negativa que várias pessoas têm do Facebook, depois de inúmeras polêmicas sobre privacidade como o escândalo Cambridge Analytica;
veio à tona uma possível “fadiga de WhatsApp”, usado no Brasil e outros países como a principal (e às vezes única) forma de contato entre amigos, parentes, clientes e empresas. O app é inescapável mesmo para quem não gosta dele, e essa polêmica deu um motivo para externar essa frustração.
Quando o WhatsApp resolveu responder à polêmica, milhões de pessoas já levantavam dúvidas sobre a confiabilidade do app. A empresa publicou um FAQ garantindo que “o WhatsApp e o Facebook não podem ler suas mensagens nem ouvir suas chamadas com colegas de trabalho, amigos e familiares”.
O WhatsApp também afirma que não mantém registro das pessoas para quem você ligou ou enviou mensagens; não pode ver sua localização compartilhada; nem compartilha seus contatos com o Facebook (apenas seu número de celular, tal como é feito há anos).
O objetivo era dar maior transparência sobre as conversas que você pode ter com empresas no app. Elas poderão armazenar as mensagens em serviços de hospedagem do Facebook para poderem acessá-las a partir de mais de um dispositivo, removendo uma limitação atual do WhatsApp Web.
Além disso, se você acessar o catálogo de uma empresa no WhatsApp através do recurso Lojas, “suas atividades de compra poderão ser usadas para personalizar sua experiência nas Lojas e os anúncios que você vê no Facebook e no Instagram”.
Telegram e Signal crescem com polêmica do WhatsApp
A resposta do WhatsApp, que em último caso deveria ser responsável por sua própria reputação, demorou demais. Eis o que aconteceu nos últimos dias:
o bilionário Elon Musk criticou o Facebook e deu uma sugestão para seus seguidores: “usem o Signal”;
o presidente executivo da Signal Foundation, Brian Acton, diz que a base de usuários do mensageiro “explodiu” – o executivo é cofundador do WhatsApp e apoiou a campanha #DeleteFacebook;
o Telegram registrou 25 milhões de novas adições em questão de dias e ultrapassou a marca de 500 milhões de usuários;
Telegram e Signal chegaram ao primeiro lugar em downloads no Google Play e na App Store em dezenas de países;
o WhatsApp está sendo investigado na Turquia por causa da nova política de privacidade;
no Brasil, a Senacon (Secretaria Nacional do Consumidor) vai notificar WhatsApp e Facebook pelo mesmo motivo; enquanto o Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) cogita medida semelhante.
Tudo isso será o bastante para “derrubar” o app de mensagens? Ainda é cedo para saber: o Facebook já passou por polêmicas semelhantes mas a empresa segue firme, lucrando bilhões a cada trimestre. No entanto, isso certamente teve algum impacto no WhatsApp, dado que eles se viram obrigados a esclarecer a situação.
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